log

log

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Teologia da Prosperidade e a Justificação do Atual Sistema

Por Levi Gabriel
 
A Teologia da Prosperidade ganhou visibilidade no mundo com Kenneth Hagin, no entanto sua gênese encontra-se no teólogo Essek William Kenyon (1867-1948) que foi estudar no Emerson College na cidade de Boston nos Estados Unidos no ano de 1892. Este colégio era conhecido como um centro do movimento metafisico que fomentou o surgimento de uma variedade de seitas com orientações suspeitas. Ali foi altamente influenciado por Mary Baker Eddy, que fundou a Ciência Cristã.

As crenças destes grupos metafísicos afirmavam que o mundo material era controlado pelo espiritual, de modo que podendo o homem exercer influencia no mundo espiritual por meio do poder de sua mente, ele podia controlar por sua vez o material. Com isto, Kenyon via uma possibilidade de aperfeiçoamento na espiritualidade cristã. Através do uso da mente o cristão poderia reivindicar os benefícios da salvação.

Kenneth Hagin, assim não teria sido o pai, mas o grande profeta desta corrente de pensamento. Este teve uma infância difícil por ter nascido com um sério problema cardíaco e por ter sido abandonado pelo pai. Dificuldade que piorou antes deste completar dezesseis anos de idade, onde ficou confinado numa cama. Nesta luta passou por algumas experiências e após algumas reflexões de textos bíblicos concluiu que por meio da palavra proferida se alcançaria a cura. Era necessário agir como que se estivesse alcançado à benção divina. O próprio relata ter sido curado.

O pregador da região do Texas tornou-se muito influente na nação, pregando em diversos lugares, alcançando visibilidade maior ainda por meio do Seminário Radiofônico da Fé, a Escola Bíblica por Correspondência Rhema, o Centro de Treinamento Bíblico Rhema e a Revista Palavra da Fé, sem contar fitas cassetes, livros e panfletos.

A influência não se deu apenas em solo norte americano, em homens como Benny Hinn, mas desceu para a América do Sul, em especial o Brasil, onde é possível identificar a chamada Confissão Positiva na vida de pregadores como R.R. Soares, Miguel Ângelo da Silva Ferreira, Valdemiro Santiago, Valnice Milhomens, entre outros.
Assim foi sendo disseminada esta teologia que crê no poder da palavra declarada e da mente para alcançar as benesses advindas do sacrifício de Cristo na cruz. Sendo assim o cristão “pode ter e alcançar tudo” que desejar, por meio do pensamento positivo e da confissão de sua fé na benção de Deus.

Por esta razão existe uma negação da dor e do sofrimento advindo de enfermidades e em especial, uma busca à conquista de bens materiais ilimitados por parte dos filhos de Deus.

É perceptível esta teologia nas declarações de dois de seus principais expoentes brasileiros, os cunhados Edir Macedo da Igreja Universal do Reino de Deus e R.R. Soares da Internacional da Graça de Deus. Afirma o primeiro:

“Um homem fugiu de casa, porque seu irmão queria matá-lo. Ele foi pelo deserto e perdeu tudo o que tinha e ficou somente com uma botija pequena de azeite. Mas ele cria em Deus, acreditava nas promessas que Ele havia feito a seus pais. Um dia ele colocou a cabeça em uma pedra no deserto, sozinho e sem nada. Ali naquela pedra ele teve um sonho com uma escada que ia da terra até o céu, e anjos subiam e desciam. Naquela visão, naquele sonho, aquele homem teve um entendimento de Deus e então fez um pacto com Ele, dizendo: ‘Se o Senhor for comigo, se me der pão para que eu coma e roupa para que eu vista, e que eu volte em paz para a casa do meu pai, então o Senhor será o meu Deus e tudo o que eu receber, eu darei o dízimo’. Ou seja, o dízimo era um sinal do pacto que ele fez com Deus. Por conta deste pacto ele começou a prosperar. Primeiro, trabalhando para o sogro e, depois, para si. Desta forma, ele se tornou um homem rico, próspero, abençoado e os inimigos não conseguiam destrui-lo.”

R.R. em um de seus livros explica sobre este poder da confissão e crítica a oração submissa ao senhorio divino, que para ele não passa de incredulidade, se tornando irrelevante:

…Usar a frase “se for a Tua vontade” em oração pode parecer espiritual, e demonstrar atitude piedosa de quem é submisso à vontade do Senhor, mas além de não adiantar nada, destrói a própria oração…
(R.R.Soares, livro “O Direito de Desfrutar Saúde”, p. 11)

O próprio Hagin neste sentido, afirma em um de seus livros:
Nós como cristãos, não precisamos sofrer revezes financeiros; não precisamos ser cativos da pobreza ou da enfermidade! Deus proverá a cura e a prosperidade para seus filhos se eles obedecerem aos seus mandamentos... Deus quer que seus filhos... tenham o melhor de tudo.
(HAGIN, Kenneth. Novos Limiares da Fé. p. 66.)

Para estes pregadores todos os cristãos quando são obedientes a Deus e exigem seus direitos podem desfrutar de saúde e riqueza de maneira ilimitada. De maneira que quem delas não desfruta ou revela desconhecimento das Escrituras ou incredulidade as promessas e desobediência a Deus. No entanto, tal afirmação além de contrariar o ensino bíblico reprova grandes homens de Deus na História.

O ensino bíblico visto de maneira harmônica, levando em consideração a totalidade da Palavra de Deus não apresenta nenhuma promessa de prosperidade financeira ou de ausência de enfermidade na vida de quem crê.

O Senhor Jesus pelo contrário teve uma vida simples e afirmou a um candidato ao discipulado que as raposas e as aves do céu com maior frequência encontrarão mais conforto do que alguns discípulos (Lucas 9.58). Disse que ao rico é quase impossível entrar no Reino dos Céus, devido à dificuldade deste em romper com a sensação de autossuficiência e egoísmo (MT 19.23). Aliás, tanto para Jesus como para os apóstolos a riqueza é um perigo para o cristão.

É surpreendente a quantidade de textos no Novo Testamento sobre este assunto. Mais de duas mil vezes este tema é abordado. Foi o segundo assunto mais ensinado pelo Mestre, tamanha a influencia que o dinheiro pode exercer na humanidade.

O ensino neotestamentário é de que, o que caminha ao lado da piedade do cristão é o contentamento. O que Deus supre são as necessidades de seus filhos e não os seus caprichos. Comida, bebida e vestes, ou seja, o que é necessário para nossa subsistência.

Caio Fábio escreve em seu livro “Seguir a Cristo, o mais fascinante projeto de vida” uma verdade interessante sobre o discípulo:

Seguir o Mestre leva mais facilmente ao desabrigo do que a um colchão d'água. É mais provável que vá dar em um pequeno apartamento do que em uma suíte presidencial.

(D’ARAÚJO FILHO, Caio Fábio. P. 10).

E mais interessante ainda é quando se faz a leitura da carta aos Hebreus no capitulo onze, onde contém o assunto de fé e de exemplos de fé. Isto porque para estes pregadores a fé "move a mão de Deus em favor do crente". Todavia o texto apresenta homens que mesmo crendo e andando de modo irrepreensível nesta terra, não receberam coisa alguma. E mesmo não recebendo foi dito sobre estes: “que o mundo não era digno deles”. Que coisa linda isto, Nosso Deus diferente do homem não se impressiona com a aparência e com o status que o homem se encontra na sociedade, mas sim com o conteúdo que este carrega, os valores do Reino de Deus.

A pergunta que fica é: se esta teologia é tão contraditória com o ensino e a vida de Jesus e dos apóstolos porque atrai tantos ouvintes? Porque razão ela cresce de maneira surpreendente?

Em primeiro lugar porque a mensagem é atrativa, pois qual ser humano em sã consciência não quer estar livre de enfermidades e gozar de uma situação financeira abundante?

Mas em segundo lugar também, porque ela segue a lógica do atual sistema econômico e da filosofia materialista deste mundo. Neste sentido a visão cristã, ao contrário do que deveria, não se difere em nada, seguindo ao mesmo curso do sistema. Ela não exige mudança na vida e pensar daquele que se converte. A cosmovisão passa a ser microvisão, restrita ao não fumar, não beber e não fazer sexo antes do casamento. A Teologia da Prosperidade ganha força e sustentação porque justifica este modelo que além de lançar os homens num consumismo desenfreado, promove uma indiferença diante da desigualdade social.

A liberdade econômica não é para todos, pois nem todos possuem acesso às mesmas oportunidades. Mas na lógica dos defensores deste sistema aqueles que estão à margem da sociedade, se encontram assim, porque são desajustados e não porque o sistema é falho. E este mesmo sujeito que já é considerado desajustado e excluído do mercado de consumo pela sociedade capitalista é também visto como incrédulo ou ignorante pelos pregadores da prosperidade.

A lógica é a mesma tanto no projetar os homens no consumismo, quanto no justificar a exclusão dos pobres das benesses. E é devido a esta compatibilidade que não se exige dos “novos convertidos” o arrependimento (metanóia) para a salvação, mas somente a “fé mágica” que move a mão de Deus a seu favor, que a Teologia da Prosperidade foi se consolidando durante décadas.

Deus é transformado no personagem do gênio da lâmpada de Aladin, fazendo tudo que seus filhos lhe pedem, sem que estes tenham compromisso com o estilo de vida do Jesus de Nazaré, o grande protótipo da humanidade. Acabam caindo na chamada “graça barata” descrita por Bonhoeffer onde o perdão não trás desdobramentos de renuncia e abnegação ao cristão. Não o levam a responder a graça com uma vida de louvor a Deus por meio das boas obras preparadas de antemão para que este andasse.

A vida nova em Cristo Jesus são as boas obras. Nelas o cristão é chamado a viver. Não porque ele é salvo por elas, mas porque elas testificam que ele é salvo e alcançou a vida nova. Por meio delas ele dá sinais de que entrou no Reino de Deus, que vive os efeitos da salvação.

É neste ponto que reside uma denuncia não apenas aos neopentecostais, mas também aos históricos.

........................................................................................................................

1 MATOS, Alderi Souza. Raízes Históricas da Teologia da Prosperidade. Disponível em: <http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/313/raizes-historicas-da-teologia-da-prosperidade>. Acesso em: 31. out.2013.

2 HAGIN, Kenneth. Eu creio em visões. Graça Editorial, 1996.

3 Benny Hinn nasceu em 03 de dezembro de 1952. É um pregador conhecido por suas frequentes “cruzadas de milagres”. Escreveu vários livros como “Bom-dia Espirito Santo”, e nos anos 90 criou um programa de televisão diário chamado: “Este é o seu dia”. É defensor da confissão positiva, influenciada por Hagin.

4 MACEDO, Edir. A importância do dízimo. Disponível em: <http://m.arcauniversal.com/noticias/historias-de-vida/reflexao/bispo-macedo-ensina-a-importancia-do-dizimo--14103.html>. Acesso em: 15.set.2013.

5 KIVITZ, Éd Rene. Quando o dinheiro se torna Mamom. Disponível em: <http://www.guiame.com.br/noticias/colunistas/ed-rene-kivitz/quando-o-dinheiro-se-torna-mamon.html>. Acesso em: 15. set. 2013.

Nenhum comentário:

Postar um comentário